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Terça-feira, 13 de Maio de 2025
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Na linha de frente pela vida trans: mulheres, ativistas e médicos enfrentam o silêncio do CREMESP

O ato exigiu escuta, responsabilidade institucional e defesa da medicina baseada em ciência, não em ideologias excludentes

Na linha de frente pela vida trans: mulheres, ativistas e médicos enfrentam o silêncio do CREMESP
Carolina Costa Especial para o Diversa AM
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No dia 24 de abril, às 16h, em São Paulo, um grupo formado por médicas, pessoas trans, travestis, estudantes e ativistas dos direitos humanos se reuniu em frente à sede do Conselho Regional de Medicina do Estado de São Paulo (CREMESP) para protestar contra a Resolução nº 2.427/2025, publicada pelo Conselho Federal de Medicina (CFM). A medida proíbe o uso de bloqueadores hormonais em adolescentes trans e restringe o acesso à hormonioterapia, provocando reações de indignação em setores da saúde, do direito e da sociedade civil organizada.

Sob o sol, ao som de palavras de ordem como “Revoga CFM!”, o ato exigiu escuta, responsabilidade institucional e defesa da medicina baseada em ciência, não em ideologias excludentes. Cartazes, faixas e manifestos denunciaram o impacto direto da medida na saúde de crianças e adolescentes trans, especialmente os mais vulnerabilizados no sistema público de saúde.

Dados e retrocessos

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 A Resolução CFM nº 2.427/2025 interrompe o cuidado de adolescentes trans no Brasil e ameaça médicos com sanções disciplinares por seguirem protocolos reconhecidos internacionalmente. No Brasil, estima-se que cerca de 29% das pessoas trans iniciem sua transição social e/ou médica antes dos 18 anos (ANTRA, 2022).

Estudos internacionais apontam que o uso de bloqueadores hormonais pode reduzir em até 70% os índices de ideação suicida entre adolescentes trans (Turban et al., Pediatrics, 2020). No Brasil, a expectativa de vida de pessoas trans gira em torno de 35 anos, enquanto a média da população brasileira é de 76,8 anos (IBGE, 2023). Em 2023, a cada dois dias, uma pessoa trans foi assassinada no país (TGEU/ANTRA), mantendo o Brasil como o mais letal para essa população pelo 14º ano consecutivo.

A resolução desconsidera completamente esses dados e rompe com o dever de não causar dano, previsto na ética médica, ao impor uma política restritiva que fere o direito à saúde.

A recusa do CREMESP

Durante o ato, representantes de organizações nacionais da saúde, da educação e dos direitos humanos tentaram protocolar um abaixo-assinado com mais de 5 mil assinaturas, solicitando que o CREMESP se posicione contra a medida do CFM e defenda a autonomia profissional e o direito ao cuidado integral da população trans.

Inicialmente, o CREMESP alegou não ter representantes para receber o documento, mesmo sendo um órgão público. O impasse só foi resolvido após a intermediação da vereadora Carol Iara (PSOL), funcionária pública de carreira, que destacou o dever legal da instituição em receber manifestações da sociedade civil.

“Não estamos pedindo um favor. Estamos exigindo que o Conselho cumpra com o dever público de escutar a população e, principalmente, proteger vidas ”, afirmou Carol Iara.

Enquanto isso, algumas cenas de desrespeito marcaram o protesto. Funcionários do CREMESP foram vistos se escondendo de forma infantil atrás das catracas, evitando o contato com os manifestantes. Um deles, especificamente, se recusou a aparecer e chegou a ameaçar de processos quem o registrasse, inclusive dificultando a cobertura fotográfica do momento. 

Inicialmente, o CREMESP alegou não ter representantes para receber o documento, mesmo sendo um órgão público
(Carolina Costa- Diversa AM)

 

Como previsto pela Constituição Brasileira e pela liberdade de imprensa, o registro de atos públicos em espaços públicos, como os que ocorrem em órgãos governamentais, é direito legítimo dos jornalistas. A fotografia do momento em que o funcionário se esquivava é um reflexo da resistência institucional à escuta das demandas de um setor vulnerabilizado da população e visa garantir a transparência dos fatos para o público. 

Além disso, o Código Civil, no artigo 21, trata do uso de imagem de uma pessoa, mas essa regra é flexibilizada quando há interesse público ou se a pessoa fotografada é uma figura pública atuando em sua função.

Esses registros são fundamentais para ilustrar a importância da transparência e do compromisso das instituições públicas com os direitos fundamentais e a saúde da população trans. O CREMESP, como órgão público, tem o dever de ser acessível e respeitar o direito da sociedade à manifestação e ao recebimento de demandas formais, conforme estabelece a legislação brasileira.

Um manifesto nacional

 Kyem Ferreiro, 34 anos, coordenador do Instituto Brasileiro de Transmasculinidades (IBRAT-SP), destacou que o abaixo-assinado protocolado é resultado de uma ampla mobilização nacional:

“Esse documento foi construído com diversas organizações e representantes de várias regiões do País. Pessoas trans e aliadas cis se somaram à convocação nacional, que envolveu conselhos de saúde, coletivos e entidades que enfrentam os ataques sistemáticos aos nossos direitos.”

“O CREMESP demonstrou bastante indiferença. O diálogo foi de idas e vindas, até que finalmente um funcionário veio cumprir com aquilo que não pode ser negado à população: o direito de entregar uma demanda formal. O documento foi protocolado e, a partir disso, seguiremos pressionando em novos atos e na construção de resistência em todo o país.”

A urgência no cuidado

 “Comecei os bloqueadores com 13 anos, acompanhada da minha mãe. Sem isso, eu não estaria viva”, disse uma jovem presente no ato, protegida sob anonimato. Profissionais da saúde alertaram que a resolução silencia o cuidado e expõe os adolescentes ao sofrimento psíquico e social.

“Estamos sendo ameaçadas por exercer a medicina baseada em evidências. A resolução criminaliza o cuidado e empurra jovens para o desespero. Isso é inaceitável”, disse uma endocrinologista da rede pública.

Segundo dados do Ministério da Saúde, a procura por ambulatórios trans aumentou 260% em cinco anos, mas o País ainda conta com menos de 40 unidades ambulatoriais especializadas em atenção trans no SUS.

STF e MPF já se movimentam

 No dia 22 de abril, a ANTRA e o IBRAT protocolaram uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) no Supremo Tribunal Federal (STF), solicitando a suspensão da Resolução nº 2.427/2025. O documento argumenta que a medida viola a Constituição ao restringir o direito à saúde, à autodeterminação de gênero e à proteção da infância.

A ação afirma que a norma parte de “valores morais de caráter transfóbico” e desconsidera “a saúde psicológica e social e a autodeterminação de crianças e adolescentes trans”. Além disso, o Ministério Público Federal (MPF) instaurou, no dia 16 de abril, um procedimento de apuração sobre a legalidade da resolução. A investigação foi aberta a partir de denúncia feita pela Associação Mães pela Diversidade e nota técnica da ANTRA. O MPF deu prazo de 15 dias para o CFM apresentar os fundamentos jurídicos e técnicos de sua decisão.

Em defesa da vida

 O ato do dia 24 de abril não foi um fato isolado, mas parte de uma jornada nacional de mobilização. Estão previstos novos protestos em outras capitais e uma manifestação nacional em Brasília. Profissionais da saúde, parlamentares, organizações de direitos humanos e movimentos populares prometem seguir pressionando as entidades médicas a revogarem a resolução.

Enquanto isso, a resistência se constrói na rua, na escuta, e no cuidado que salva vidas.

FONTE/CRÉDITOS: Carolina Costa - DIVERSA AM/ POLÍTICA DIVERSA
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